Redes sociais e a influência no consumismo

 Para fazer parte de um grupo, usuários são levados a comprar cada vez mais produtos, muitas vezes sem necessidade.

compras online

O acesso facilitado a itens por meio do e-commerce e as constantes propagandas direcionadas têm

impulsionado o consumismo. - Foto: Mercado & Consumo

Com um marketing agressivo, repleto de publicidades e trends, os Influencers incentivam os usuários a consumirem produtos de forma cada vez mais acelerada, especialmente nos nichos de moda, beleza e autocuidado. Este comportamento pode levar a sérios problemas psicológicos, como o transtorno compulsivo de compras, e o endividamento.

Segundo o DataReportal - Global Digital Insights, plataforma líder em análise de dados do ambiente digital global, o TikTok possui 84,1 milhões de usuários com mais de 18 anos no Brasil. Os dados também revelam que, mundialmente, 53,4% dos usuários são mulheres e 38,5% têm entre 18 e 24 anos, ou seja, fazem parte da Geração Z.  Esta geração compreende os nascidos entre o fim da década de 1990 e 2010, e são os chamados “nativos digitais”, ou seja, são aqueles que tiveram acesso à internet desde o nascimento e, por isso, mantêm uma relação com as redes diferente das demais gerações. 

De acordo com um levantamento do Conselho Internacional de Shopping Centers (ICSC), divulgado em junho de 2023, cerca de 85% da geração Z admite que as redes sociais influenciam suas escolhas de compra. A pesquisa também aponta que o Instagram e o TikTok são as plataformas com maior impacto entre esses consumidores.

Para o professor de marketing digital da ESPM Rio, João Vitor Rodrigues, a característica principal das compras por sites como o Instagram é, justamente, o social. “Diz respeito à possibilidade de você sentir, notar, ver, perceber o uso daqueles produtos junto a outras pessoas, com quem você certamente pode se identificar no sentido de altura, personalidade, atitude, cor da pele, cabelo… Isso gera uma aproximação”.

Infográfico indicando o publico consumidor de TikTok no Brasil. - Realizado por Mariana Souza.

Geração Z - Pandemia e consumo

A pandemia de COVID-19 alterou a forma de consumo em escala mundial e as compras online cresceram de forma exponencial. Durante este período, a rede social TikTok ultrapassou o Facebook em número de downloads, movimentando US$112 bilhões em 2020, sendo uma das principais redes influenciadoras de consumo e lifestyle

A maneira como os jovens pensam e se relacionam também mudou. Após quase dois anos sem frequentar a escola presencialmente ou participar de festas e encontros sociais, seus hábitos de consumo e preferências foram moldados, em grande parte, de forma online. 

A estudante Bárbara Oliveira, de 17 anos, afirma: “Quando a pandemia começou, eu ainda estava no oitavo ano e, quando voltei pra escola, já estava no ensino médio. Passei muito tempo na internet durante esse período.  Acabei consumindo bastante conteúdo e, com certeza, aprendi muito sobre moda e estilo vendo as trends e as influenciadoras por lá. E não foi só eu, várias amigas minhas também passaram por isso.” 

Dentro do TikTok, os ramos de moda, beleza e autocuidado são alguns dos mais consumidos pelas jovens do sexo feminino. Algumas das hashtags mais populares nesse nicho incluem: #HairTok (com 4,2 milhões de publicações), #maquiagem (com 2,6 milhões de vídeos), #grwm (“get ready with me” ou, em português, “Arrume-se comigo” com 14,7 milhões), #dupe (com 280 mil publicações) e #FashionTikTok (com 15,8 milhões).

Com o objetivo de aproximar o espectador, as influenciadoras realizam tutoriais de maquiagem, indicam produtos, compartilham experiências sobre cuidados capilares, exibem seus looks do dia com peças tendência e, no caso da hashtag #dupe, apresentam ideias de réplicas e produtos que podem substituir os itens mais caros da moda.

O Dupe se apresenta como uma alternativa para aqueles que desejam gastar menos mas que não querem deixar de seguir as tendências. - Imagem: retirada do TikTok

Roupas descartáveis: A era do Ultra Fast Fashion

O Fast Fashion, ou moda rápida, é o modelo de negócio que se concentra na produção em massa de peças de vestuário, com o objetivo de acompanhar as tendências atuais o mais rapidamente possível. Embora pareça uma opção atraente, devido à sua capacidade de oferecer produtos a preços acessíveis e seguir as últimas tendências, a indústria de fast fashion cria coleções tão rápidas que muitos consumidores mal conseguem acompanhar. Além disso, essas peças costumam ter menor durabilidade.

Atualmente, com sites de compra como a Shein, a moda ultrapassou o conceito de Fast Fashion e passou a ser chamada de Ultra Fast Fashion, acompanhando a velocidade do consumismo atual.

Outra questão bastante levantada quando falamos sobre a moda Fast Fashion são os preços das roupas fora desse segmento. Embora muitas dessas peças tenham qualidade elevada, seu custo mais alto faz com que uma grande parte da população recorra ao modelo de roupas mais acessíveis.

A design de moda, Olívia Constantino, aponta: “Roupa é algo muito caro, porém as Fast Fashion normalizaram para as pessoas os preços mais baratos. Por exemplo, são vendidas blusas por R$20,00 e é impossível produzir de maneira correta uma blusa por este valor.” e conclui  “A Fast Fashion, além de causar danos ambientais, tem a questão de que muitas vezes as pessoas que estão trabalhando nessa indústria não tem um trabalho digno. Não tem como pagar salários justos com esses preços que são cobrados.” 

A moda deve ser inacessível?

A aquisição excessiva de bens e o consumismo como estilo de vida levam os usuários a comprar diversos produtos, muitas vezes com a mesma finalidade, além de itens de moda que rapidamente serão substituídos. Não é difícil encontrar na internet histórias de pessoas que se endividaram ao comprar objetos desnecessários e parcelar produtos.

As redes sociais estão repletas de conteúdos com o termo 'Girls Math' (ou 'matemática das garotas', em português), que supostamente envolvem cálculos feitos por mulheres para justificar seu consumismo. Um exemplo de 'Girls Math' seria comprar um shampoo de R$200,00 e parcelá-lo em 10 vezes, fazendo com que o custo mensal do shampoo fosse de apenas 20 reais.

Muitas pessoas acabam se endividando devido às compras exageradas, que ultrapassam o orçamento. - Foto: site Frenet

Em janeiro deste ano, as influenciadoras do nicho de moda e comportamento Daniela Kim (9,7 milhões de seguidores) e Malu Camargo (3,8 milhões) postaram um vídeo juntas falando sobre “Coisas da moda que achamos que deveriam ficar em 2023". O conteúdo discutia como algumas peças de roupa, como os tênis Air Jordan 1, que custam em média R$1.099,00, e as bolsas da Diesel, com preços que variam entre R$1.654,00 e R$13.860,00, estavam “saturadas”. A influenciadora Carla Balta (353 mil seguidores) também publicou em janeiro um vídeo na plataforma com o mesmo título, criticando o uso de itens de moda que foram tendências do ano anterior, como cropped e wide leg, saias jeans longas e a estética “Barbie core” — tendência que surgiu em julho de 2023 com o lançamento do filme da Barbie e consistia em criar um look majoritariamente rosa. 

No vídeo, elas afirmam ter usado, criado looks para a internet e influenciado a compra dessas peças, mas que agora estariam cansadas devido à quantidade de pessoas que estão usando. Assim, elas evidenciam um movimento notório nesta atmosfera online: a moda só é interessante quando é inacessível. 

Olívia destaca que “A moda é algo muito elitista. As pessoas querem comprar algo porque isso vai valorizar o status delas e, se todo mundo começar a usar, isso vai prejudicar o status, então elas não irão mais querer. A partir do momento em que a massa começa a usar algo, é óbvio que as pessoas que estavam usando primeiro, tanto as que têm um estilo Vanguard quanto as que seguem a moda porque muita gente rica está usando, não vão mais querer usar. É normal: você não quer ser igual a todo mundo, mas ao mesmo tempo quer se encaixar em determinado grupo.” 

A partir disso, surgiu uma trend chamada “Coisas que deveriam ficar em 2023”, que inclui tanto vídeos semelhantes aos mencionados acima quanto aos de criadores de conteúdo criticando a postura consumista predominante na plataforma.

Project Pan e a busca pelo consumo consciente 

O Project Pan é uma iniciativa que tem como propósito incentivar que as pessoas utilizem seus cosméticos até o final antes de comprar novos. 

Mês a mês as influencers gravam vídeos mostrando os produtos de autocuidado que finalizaram, buscando incentivar outras pessoas a fazerem o mesmo.

A trend do TikTok, associada às hashtags #ProjectPan (18,1 mil) e #acabados (55,8 mil) permite com que criadores de conteúdo, que muitas vezes possuem contas de até 10 mil seguidores, compartilhem este processo com seu público.

Imagem retirada do TikTok.

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