Mulheres nos esportes: Como a vitória da Rebeca Andrade trouxe interesse dos jovens ao esporte
Por: Hanna Kauanin Magalhães da Silva
A vitória na categoria de equipe e as conquistas de medalhas de Rebeca Andrade fizeram com que crianças e jovens do país todo procurassem mais do esporte.
Rebeca Andrade e crianças em guarulhos após retorno da atleta ao Brasil | Reprodução: Tiago Queiroz
Em 2024 ocorreu as Olimpíadas, um dos maiores eventos esportivos, desta vez na cidade de Paris. Enquanto os atletas do mundo inteiro disputavam as medalhas, o Brasil chamou a atenção no quadro mundial, por ter levado 20 medalhas para casa. Apesar do time de futebol masculino não ter sido convocado para a disputa, outros esportes receberam destaques e, um dos que mais chamou a atenção foi a ginástica artística. Fazendo com que diversos jovens procurassem o esporte.
A disputa por equipes fez com que o país levasse pela primeira vez uma medalha na categoria, sendo a de bronze. O grupo composto por Jade Barbosa, Rebeca Andrade, Julia Soares e Lorrane Santos fez história. Porém, essa não foi a única conquista feminina no evento nem na categoria. Beatriz Souza, Tatiana Weston-Webb, Duda e Patricia, Rayssa Leal, Larissa Pimenta, Bia Ferreira e as equipes de vôlei feminino e de futebol também adicionaram medalhas no quadro.
As mulheres nas Olimpíadas de 2024:
A primeira medalha do país veio de Beatriz Souza, atleta de judô na categoria pesado, conquistando o ouro. Abrindo portas para os outros atletas. Porém a maior conquista de medalhas veio de Rebeca Andrade, conquistando quatro medalhas, uma de bronze, duas de prata e uma de ouro, superando a “adversária”, Simone Biles.
Simone Biles, Jordan Chiles e Rebeca Andrade no pódio da categoria de solos | Reprodução: Internet
Apesar de serem uma parte importante do evento em 2024, as Olimpíadas decidiram adicionar oficialmente as mulheres em 1919, pós Primeira Guerra Mundial, decisão realizada pelo Comitê Olímpico Internacional (COI). Mas, as únicas atividades que poderiam ser feitas eram tênis e natação.
Em 1964, o vôlei se tornou o primeiro esporte em equipe que poderia ser disputado por mulheres, no ano de 79 houve a conquista das disputas de basquete e em 86 o futebol e judô. Depois destes anos, as mulheres começaram a ter participações significativas.
Mulheres disputando as olimpíadas na categoria natação | Reprodução: Internet
Neste ano, as mulheres estavam compondo cerca de 55% das disputas, apesar de algumas não ganharem medalhas, muitas conquistaram postos que não haviam sido considerados antes. O professor de educação física e judoca, Douglas Bachega, comenta sobre a importância de mulheres aparecerem nas olimpíadas: “Então quanto mais mulheres aparecerem competindo em alto nível, independente de ganharem ou não, mais a modalidade começa a ficar mais visível, isso abre portas para que as meninas acabem desde cedo naquelas modalidades.”
Porém, a ginástica artística como esporte olímpico teve a sua primeira aparição em 1896, na Olimpíada de Atenas, Grécia, país berço das Olimpíadas. Mas, a participação feminina foi apenas em 1928, em Amsterdã, Holanda. Apesar dos anos de diferença em que as mulheres conseguiram conquistar de forma obrigatória, a ginástica artística começou a ter uma presença feminina muito forte. A treinadora e professora de ginástica artística Liz Cogine explicou: “A ginástica artística apesar de ser um esporte masculino e feminino, aqui no Brasil, o número de meninas que praticam é muito mais alto do que de meninos. Geralmente as meninas que se destacam são meninas menores, pois a estatura influencia muito na modalidade.”
No esporte, diversas mulheres brasileiras acabaram se destacando, tanto internacionalmente quanto nacionalmente, Daiane dos Santos, Daniele Hypolito, Rebeca Andrade, Julia Soares e Flávia Saraiva são alguns dos exemplos. Em especial, Daiane dos Santos e Rebeca Andrade.
Ginástica artística no Brasil:
Antes de Rebeca Andrade conquistar suas medalhas e se tornar uma das atletas mais influentes e com os maiores títulos no país, a ginástica artística não era um dos esportes mais conhecidos. A prática surgiu no século XIX, na Alemanha, com o pedagogo Friedrich Ludwig Christoph Jahn. Mas o esporte chega ao Brasil no final do século XIX com os imigrantes europeus.
Apesar dos anos que esteve presente no país, a ginástica começou a se tornar presente e aparecer nas televisões brasileiras com Cláudia Magalhães, que representou o país nas olimpíadas de Moscou, em 1980. Mas apenas nas Olimpíadas de Sydney o Brasil conseguiu a sua primeira medalha de prata na categoria, com Daniele Hypolito.
Daiane dos Santos nas Olimpíadas | Reprodução: Internet
Em 2003, Daiane dos Santos se torna a aposta brasileira para as vitórias, apesar de nunca ter conquistado medalhas nas olimpíadas, apenas em mundiais, a brasileira moldou o esporte para as próximas gerações. Tendo também dois saltos com o seu nome, o "Dos Santos I e II". Além disso, ela foi a primeira ginasta negra a ganhar medalhas no mundial de ginástica. Rebeca Andrade também já comentou sobre a sua inspiração na ginasta, quando mais nova em um treinamento no Centro de Ginástica de Guarulhos acabou treinando ao lado de Daiane e comentou: “As vezes eu não tava conseguindo fazer alguma coisa e elas me ajudavam”.
Mas, Rebeca Andrade se tornou uma das maiores atletas da modalidade, fazendo parte das inspirações de diversas colegas. Além de aparecer no documentário de Simone Biles. “Rebeca Andrade, ela é a que mais me assusta”, revelou a ginasta estadunidense em “O retorno de Simone Biles”, disponível na Netflix.
Após a vitória na categoria em equipes, Daiane dos Santos se emocionou ao comentar a trajetória das brasileiras, “Há 20 anos atrás, a gente entrou pela primeira vez com uma equipe completa, que foi em Atenas. E agora a gente vê o Brasil ser medalhista olímpico, as meninas fizeram tudo pra que esse momento acontecesse agora. E é muito bom ver que elas mais do que merecido. E vê elas no pódio hoje é incrível.”
Mulheres e esportes:
Muitas vezes, algumas meninas não querem participar das aulas de educação física, isso pode acabar ocorrendo por diversos motivos. A pesquisadora Carolina Mezzetti de Freitas, em um dos episódios “Aqui tem ciência” da rádio da UFMG, revelou que 50% das meninas ficavam nas arquibancadas. “E nessa contabilização, eu contava quantos participavam das aulas [Meninas né]. A gente tinha uma média de 50% das meninas na arquibancada, então isso é um número muito grande, não quer dizer que não tenham meninos, mas o número de meninas era maior.”
Em entrevista com as alunas, elas contaram que poderiam ser por diversos motivos, a vergonha sendo uma das principais. Preocupações com a aparência, vergonha do próprio corpo, não higienização dos banheiros, quadras descobertas, pessoas olhando seus movimentos na aula como movimentos sexuais, agachar ou correr, são alguns dos motivos também apontados. Além disso, faltas de outras modalidades nas aulas foram citadas.
“A mudança dos esportes nas escolas vem acontecendo a algum tempo, principalmente quando a escola tem montado uma escolinha de esportes, que é quando a gente oferece o maior número de esportes possível para elas participarem, desde educação infantil, fundamental I, onde geralmente tem judô, capoeira, ginástica, circo, handebol, voleibol, futsal e por aí vai. Aí a criança acaba se desenvolvendo, conhecendo, aprendendo e melhorando as atividades dela num determinado esporte e aí ela começa a crescer e se direcionar para aquele que ela mais gosta e tem mais habilidade.”
Porém, agora é perceptível que as meninas voltaram a fazer aulas de educação física, demonstrando interesse na matéria, “Olha, eu notei duas habilidades que eu trabalhei bem de perto esse ano, que tiveram realmente um crescimento das meninas pós pandemia, que foi a ginástica e o handebol feminino também. Essas duas modalidades chamaram bastante a atenção das meninas do ensino fundamental dois e médio.”, compartilhou o professor Douglas Bachega.
Aula de educação física | Reprodução: Internet
Com isso, as olimpíadas acabaram se tornando um ponto de conhecimento e desejo para os alunos durante as aulas. Além disso, com a visão de assistir não apenas a ginástica, mas muitos esportes diferentes entre si, pode acabar fazendo com que as crianças e jovens no geral tenham o desejo de participar dos esportes e se interessem, “Em geral, grande parte dos alunos gostam bastante desse momento que acontece durante as olimpíadas, alguns esportes não tão conhecidos por eles acabam aparecendo nesse momento, mais na mídia, isso chama a atenção de todos eles. E aumenta sim bastante a procura, não só nas aulas de educação física, mas nas aulas de esportes, as academias também acabam conseguindo aumentar o número de praticantes.”
Efeito Rebeca, crescimento na ginástica:
Diferente dos outros anos, a ginástica e as premiações em equipe e individuais fez com que diversas academias do esporte aumentassem de forma exponencial, “Após a vitória da Rebeca Andrade houve sim uma grande procura de novas matrículas na modalidade. No colégio onde eu trabalho, após as olimpíadas todas as turmas de ginástica artística lotaram e estão com lista de espera.”, contou a treinadora Liz Cogine. Apesar de participar de um centro de treinamento na região sul do país, outros lugares também receberam bastante inscrição, em Salvador (BA), Belo Horizonte (MG) e Guarulhos (SP) são apenas algumas das cidades em que a procura pelo esporte se tornou alta.
A ginástica artística, acabou sendo uma das modalidades mais comentadas no ano de 2024, na pesquisa realizada pelo instituto Datafolha e o Codecs, as menções ao esporte foram cerca de 26%, recebendo mais citações do que o vôlei.
Da direita para Esquerda, Jade Barbosa, Flávia Saraiva, Rebeca Andrade, Lorraine Santos e Julia Soares | Reprodução: Ricardo Bufolin (CBG)
Apesar de ser um esporte que muitas pessoas recomendam iniciar cedo “A ginástica artística é um esporte muito complexo, exige muito de muitas capacidades físicas diferentes. Toda e qualquer idade pode iniciar na modalidade, mas quando inicia criança é mais fácil para “moldar” essas capacidades físicas. O corpo da criança está preparado para receber diversos estímulos diferentes e ir se adaptando e se acostumando com eles.”. Diversos jovens começaram a querer participar dos esportes, independente da idade.
“Várias olimpíadas já aconteceram e não repercutiram como essa de 2024. A ginástica artística masculina brasileira não conseguiu levar nenhuma medalha para casa, e se repararem, muitas pessoas nem sabiam que teve competição masculina.”
Apesar do provável crescimento, muitas vezes os esportes que não são futebol, acabam recebendo apenas visibilidade durante as Olimpíadas, “Em geral o esporte no Brasil (com exceção do futebol) precisa de mais investimentos. Quem acompanha os clubes de ginástica artística, em redes sociais, sempre irá encontrar algum post de vaquinha para ajudar os atletas a juntarem dinheiro para ir para competição.”, compartilhou a professora.
Mas, os treinadores continuam positivos em relação a base que essas olimpíadas proporcionou, “Mais crianças e jovens se interessando pela modalidade, significa que uma nova base se inicia, para quem sabe, daqui alguns anos não seja nossa nova geração de atletas que irão representar nosso país.”
Rebeca Andrade, em um evento em João Pessoa (PR), comentou sobre ser referência para novos ginastas. “Eu entendo a importância de ser uma referência. O esporte é muito difícil, mas ele ensina muitas coisas também.”. Não apenas a ginástica artística moldou novos momentos para o Brasil, mas a ginástica rítmica também alcançou novas conquistas.
Com a adesão de mulheres nos esportes, ainda mais brasileiras e em especial mulheres negras, diversas crianças, com foco nas meninas, começaram a perceber que poderiam fazer parte dos jogos olímpicos. Mesmo que o futebol e o vôlei atuem como os esportes mais assistidos, a ginástica começou a aparecer mais e mais.
Comments
Post a Comment